Compra e arrendamento de imóvel rural por estrangeiro: o que se espera do julgamento do STF?
21 de abril de 2024, 7h07
Os mercados nacional e internacional aguardam com grande expectativa a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 342, a qual pode influenciar significativamente os investimentos estrangeiros no setor agrário e, consequentemente, na economia brasileira.
A ADPF 342, ajuizada em 16 de abril de 2015, é considerada um caso relevante em análise pelo STF porque discute a aplicação da Lei 5.709/1971, especificamente seu artigo 1º, parágrafo 1º, que impõe restrições à aquisição de imóveis rurais por empresas brasileiras com capital majoritariamente estrangeiro.
Não se discute que restrições específicas, especialmente em áreas de fronteira, visando a proteger a soberania nacional e garantir o uso adequado dessas terras, são importantes.
No entanto, outras reservas que são impostas a empresas com capital estrangeiro parecem violar os princípios e as garantias constitucionais relevantes e irrenunciáveis, como o da livre iniciativa e o da igualdade.
Vinculada à ADPF 342 está a Ação Cível Originária (ACO) 2463, proposta pela União e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), para anular o parecer da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, que dispensa tabeliães e oficiais de registro de aplicar a norma que restringe a aquisição de imóveis rurais por estrangeiros. Quando houve o ajuizamento dessa demanda, em 2014, o ministro Marco Aurélio Mello suspendeu a eficácia desse parecer.
A aquisição de imóveis rurais por estrangeiros atualmente é regida pela Lei Federal nº 5.709/71 e pelo Decreto nº 74.965/74, que a regulamenta, impondo limitações para aqueles que desejam adquirir imóveis no Brasil, como por exemplo: residência ou autorização para funcionar no Brasil (tanto para pessoa física como jurídica); efetiva exploração da terra; limitação de tamanho da área; e autorização do Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Wenderson Araujo/Trilux/CNA
Com a Emenda Constitucional nº 6/95, que revogou o artigo 171 da Constituição, a empresa brasileira detida por maioria de capital ou controle estrangeiro (Empresas Brasileiras de Capital Estrangeiro) foi equiparada à empresa brasileira de capital nacional. Dessa forma, os investidores estrangeiros que desejavam adquirir terras no Brasil deveriam constituir uma sociedade brasileira.
Restrições aos estrangeiros
Porém, depois de anos de entendimento pacífico e consolidado, em agosto de 2010, a Advocacia Geral da União publicou um parecer (AGU/LA — 01/2010) determinando que as limitações e as restrições impostas pela Lei Federal nº 5.709/71 voltariam a ser aplicadas às empresas brasileiras de capital estrangeiro.
Nesse sentido, essas empresas passaram a depender de autorização governamental para realizar a aquisição e/ou o arrendamento de imóveis rurais.
Não é possível que se acolha que um parecer que possa dar interpretação restritiva à Constituição, esvaziando inclusive o que o próprio legislador pretendeu ao revogar o artigo 171 da Constituição, quando aprovou a Emenda Constitucional nº 6/95. O parecer da AGU traz de volta o texto da Constituição que não tem mais vigência sem o processo legislativo necessário para tanto, o que não se pode admitir.
Os impactos econômicos dessas mudanças são evidentes, e as restrições impostas acabam impactando o mercado e diminuindo os investimentos no país.
Vale destacar que os investimentos estrangeiros representam um papel importante na economia e trazem impactos fundamentais no crescimento e no desenvolvimento do País. São evidentes o influxo de recursos financeiros, o fortalecimento da indústria e dos serviços e a geração de empregos em áreas como agricultura e manufatura.
Não se pode esquecer que esses investimentos são acompanhados de novas tecnologias e processos de produção modernizados. Além disso, proporcionam o acesso do Brasil a mercados internacionais, com mais investimentos e parcerias comerciais, aumentando as exportações e diversificando as fontes de receitas.
Aquecimento do setor
A decisão do STF sobre a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 342 terá implicações significativas. Se for julgada procedente, potencializará a aquisição de terras por empresas brasileiras de capital estrangeiro, aquecendo o mercado, gerando investimentos, empregos e desenvolvimento.
Se for improcedente, manterá as restrições atuais, com a vigência da legislação que limita a propriedade de terras rurais no País. O resultado dessa demanda repercute diretamente na ACO 2463, acolhendo-se ou não o mérito do parecer emitido pela Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo.
Um julgamento prévio sobre um pedido de liminar foi feito em 2023.
O ministro André Mendonça, do STF, havia determinado a suspensão de todos os processos na Justiça que tratam da compra de imóveis rurais no país por empresas brasileiras que tenham participação majoritária de estrangeiros — suspensão essa que pretendia evitar decisões divergentes e a insegurança jurídica no contexto. Votaram a favor do referendo da liminar proposta por Mendonça, além dele, os ministros Edson Fachin, Dias Toffoli, Nunes Marques e Carmen Lúcia.
De outro lado, os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Gilmar Mendes e Rosa Weber (na época presidente do STF) votaram contra o referendo da liminar. Argumentaram que a suspensão total dos processos, sem uma perspectiva de resolução da controvérsia, causaria insegurança jurídica ainda maior e teria impactos econômicos significativos, criando limitações para as empresas nacionais de capital estrangeiro na aquisição de imóvel rural que também se aplicaria ao arrendamento.
O placar empatado, observando as disposições regimentais do STF, manteve a situação atual (sem a suspensão nacional dos processos relacionados) até uma nova votação, ora sobre o mérito, com a corte completa.
Agora, na assunção do novo ministro Flavio Dino, almeja-se o equilíbrio e a regulação da matéria de acordo com os interesses da nação. Estão em debate valores como: igualdade, livre iniciativa, direito de propriedade e desenvolvimento nacional.
Uma decisão do STF, portanto, precisa garantir a segurança jurídica e o bem maior do País, promovendo os investimentos estrangeiros e maximizando seus benefícios para o desenvolvimento sustentável do Brasil.
- Robson de Oliveiraé advogado no Demarest Advogados, especialista em Direito Agrário e Imobiliário, pós-graduado em Direito Imobiliário e mestre em Direitos Humanos, Interculturalidade e Desenvolvimento pela Universidade Pablo de Olavide (Sevilha/Espanha).